No inicio do mês de Janeiro de 2025, vivi um dos momentos mais difíceis da minha vida: perdi meu pai. A dor da despedida foi intensa, e, no meio desse processo, observei algo que me marcou profundamente—como minha filha, que está no espectro autista, reagiu a tudo isso de um jeito tão particular e, ao mesmo tempo, tão genuíno.
Sempre houve um vínculo especial entre meu pai e minha filha. Eles compartilhavam momentos únicos, uma conexão silenciosa, mas muito forte. No entanto, durante o período da doença e da despedida, percebi que minha filha adotou uma postura diferente. Ela se manteve à distância, observando tudo de um jeito próprio, sem se aproximar fisicamente, mas sem ignorar o que acontecia no ar.
A Forma Diferente de Processar o Luto em Criança com Autismo
Cada pessoa tem sua maneira de lidar com a perda, e no caso de crianças autistas, isso pode ser ainda mais particular. Enquanto para muitos o luto é marcado por lágrimas, abraços e palavras de consolo, minha filha demonstrava sua forma de processar a situação de um modo que, à primeira vista, poderia parecer frieza, mas que, na verdade, era apenas o seu jeito de entender e sentir o momento.
Ela observava meu pai de longe, sem interferir. Não chorava nem fazia perguntas constantes, mas eu sabia que ela estava absorvendo tudo. Respeitei esse espaço, mesmo sem saber exatamente o que se passava dentro dela.
Quando a Distância se Tornou Aproximação
Algo surpreendente aconteceu algums momentos antes do falecimento do meu pai. Minha filha, que antes se mantinha afastada e parecia processar tudo de forma introspectiva, se aproximou dele no momento final. Sem medo, sem hesitação, como se estivesse esperando aquele instante para dizer adeus à sua maneira.
Foi um momento de profunda conexão, um adeus silencioso, um abraço leve, mas repleto de significado. Essa atitude me ensinou que o luto pode ser vivido de formas diversas e que não há uma única maneira “correta” de sentir e expressar a dor da perda.
O Que Aprendi com Minha Filha: Como o Luto e o Autismo Se Cruzam na Perda de um Ente Querido
Essa experiência me fez refletir sobre o quanto precisamos respeitar os diferentes processos emocionais, principalmente no caso de crianças autistas. Nem sempre as reações serão as que esperamos, mas isso não significa que não há sentimentos envolvidos.
Minha filha me ensinou que:
- O luto pode ser vivido em silêncio e ainda assim ser intenso.
- Nem sempre a proximidade física define a profundidade de uma relação.
- Cada um tem seu tempo e seu jeito de processar emoções.
- O amor e a conexão vão além das palavras ou gestos convencionais.
A despedida do meu pai foi dolorosa, mas também me trouxe lições valiosas sobre aceitação, respeito e a singularidade da vivência emocional de cada um. E, acima de tudo, me mostrou como minha filha, com seu jeito único de ver o mundo, consegue transformar até os momentos mais difíceis em oportunidades de aprendizado e amor.
A perda de um ente querido é sempre um momento difícil, e quando meu avô faleceu, toda a família sentiu o impacto. Ele era uma figura presente, cheia de histórias e carinho, e sua ausência trouxe um vazio imensurável. Cada um de nós lidou com o luto de maneira diferente, mas foi ao observar as crianças da família que percebi como essa experiência pode ser ainda mais complexa para elas.
No caso das crianças no espectro autista, o luto pode se manifestar de formas inesperadas. Algumas podem não demonstrar sinais evidentes de tristeza, enquanto outras podem ter reações intensas e difíceis de compreender. A forma como processam a perda pode diferir significativamente, exigindo uma abordagem mais sensível e adaptada às suas necessidades.
Neste artigo, queremos compartilhar nossa experiência pessoal com a perda do meu pai e como essa vivência impactou nossa família, especialmente as crianças. Espero que este relato possa trazer acolhimento e insights para outras famílias que enfrentam desafios semelhantes, ajudando-as a lidar com esse momento delicado da melhor maneira possível.
O Luto na Infância e no Autismo
O luto é um processo desafiador para qualquer pessoa, mas para as crianças pode ser ainda mais complexo, pois elas ainda estão desenvolvendo sua compreensão sobre a morte e as emoções associadas a ela. Crianças neurotípicas costumam expressar o luto de maneiras variadas: algumas choram e fazem perguntas sobre a perda, enquanto outras podem parecer não reagir de imediato, processando a situação ao longo do tempo. Com o apoio adequado, geralmente conseguem integrar essa experiência ao seu mundo emocional e seguir em frente.
Para crianças autistas, o luto pode se manifestar de formas diferentes. Sua compreensão literal da vida pode dificultar o entendimento de conceitos abstratos, como a morte. Frases comuns, como “o vovô virou uma estrela” ou “ele foi para um lugar melhor”, podem gerar confusão, pois são interpretadas de forma concreta. Algumas crianças podem perguntar repetidamente quando a pessoa falecida voltará ou ter dificuldades em aceitar a permanência da perda.
Outro aspecto importante é a dificuldade na expressão emocional. Algumas crianças autistas não demonstram tristeza da maneira esperada ou podem reagir de forma inesperada, como rindo ou focando em interesses específicos para regular suas emoções. Isso não significa que não estejam sentindo a perda, mas que processam o luto de um modo único.
Além disso, a morte de um ente querido pode trazer mudanças na rotina, o que pode ser um grande desafio para uma criança autista. Eventos como o funeral, visitas de parentes e alterações na dinâmica familiar podem gerar ansiedade e desregulação emocional.
É essencial respeitar o tempo e a forma como cada criança, autista ou não, processa o luto. Algumas precisarão de explicações claras e objetivas, outras podem precisar de apoio sensorial para lidar com a sobrecarga emocional. O mais importante é oferecer um ambiente seguro, com acolhimento e compreensão, permitindo que a criança expresse seus sentimentos da maneira que for mais confortável para ela.
A Perspectiva Única da Minha Filha
Quando chegou o momento de contar para minha filha sobre a partida do meu pai, eu sabia que precisava escolher as palavras com cuidado. Expliquei de forma simples e objetiva que ele havia falecido, que seu corpo não funcionava mais e que, por isso, não o veríamos novamente. Sua reação inicial foi de aparente indiferença. Ela apenas assentiu com a cabeça e voltou a se concentrar em sua atividade favorita no momento. Não houve lágrimas, perguntas ou sinais imediatos de tristeza.
Nos dias seguintes, percebi que sua forma de expressar o luto era muito diferente do que eu esperava. Em vez de falar sobre saudade, ela começou a repetir frases que ele costumava dizer, como se estivesse tentando mantê-lo presente de alguma maneira. Também demonstrou preocupação com a rotina: perguntou se continuaríamos visitando a casa onde ele morava e se os móveis permaneceriam no mesmo lugar.
Uma das expressões mais inesperadas de sua dor veio através de um desenho. Em um papel, ela desenhou o bisavô sentado na poltrona onde ele sempre ficava, mas sem ninguém ao seu redor. Quando perguntei sobre a imagem, ela disse apenas: “Agora está vazio.” Essa foi sua maneira de demonstrar o impacto da perda, sem lágrimas ou longas explicações, mas com uma clareza emocional profunda.
Outro momento marcante aconteceu algumas semanas depois, quando estávamos organizando fotos da família. Ao ver uma imagem do avô sorrindo, ela tocou a foto e disse, com um tom tranquilo: “Ele ainda está aqui, mas de outro jeito.” Foi então que percebi que, à sua maneira, ela havia encontrado um significado para a ausência e estava aprendendo a lidar com a saudade do seu próprio jeito.
Essa experiência me ensinou que o luto não tem uma única forma de se manifestar. Cada criança, especialmente aquelas no espectro autista, pode ter maneiras únicas e inesperadas de processar a perda. O mais importante é estar presente, acolher suas emoções — mesmo quando parecem diferentes do que esperamos — e respeitar seu próprio tempo para compreender e se adaptar a essa nova realidade.
Estratégias e Aprendizados
Diante da reação única da minha filha ao luto, nossa família precisou buscar maneiras sensíveis e respeitosas para ajudá-la a compreender e lidar com a partida do avô. Em vez de esperar que ela expressasse a dor da maneira tradicional, nos adaptamos ao seu modo de processar a perda, oferecendo suporte de forma clara, objetiva e afetuosa.
Uma das estratégias mais eficazes foi o uso de recursos visuais e simbólicos. Contamos histórias sobre o ciclo da vida, usando livros infantis que abordam a morte de forma delicada e acessível. Também incentivamos o uso de desenhos para que ela pudesse expressar seus sentimentos sem a necessidade de palavras. Além disso, permitimos que escolhesse um objeto simbólico do avô para guardar — no caso, um lenço que ele sempre usava. Isso ajudou a criar uma conexão tangível com as memórias afetivas.
A comunicação aberta foi essencial. Respondemos às suas perguntas com honestidade, respeitando sua necessidade de explicações literais. Em vez de eufemismos, dissemos com clareza que o bisavô havia falecido e que seu corpo não funcionava mais. Dessa forma, evitamos confusões que poderiam gerar insegurança ou expectativas irreais.
Um aprendizado valioso desse processo foi entender a importância de validar os sentimentos dela sem impor padrões de luto. Se ela não chorava ou não demonstrava tristeza da maneira esperada, isso não significava que não estivesse sentindo a perda. Respeitamos seu tempo e suas formas de expressão, compreendendo que cada pessoa, especialmente dentro do espectro autista, pode vivenciar o luto de maneira única.
Ao longo dessa jornada, aprendemos que o mais importante não é a forma como a dor se manifesta, mas sim o suporte que oferecemos. Estar presente, acolher, adaptar a comunicação e garantir um ambiente seguro fez toda a diferença para que minha filha pudesse processar a perda à sua maneira, sem pressões ou expectativas irreais. E, acima de tudo, reforçamos a mensagem de que o amor e as memórias permanecem, mesmo quando alguém querido não está mais fisicamente presente.
Conclusão
Essa experiência com o luto me ensinou lições profundas sobre a complexidade de como as crianças, especialmente aquelas no espectro autista, lidam com a perda. Aprendi que o luto não tem um molde único e que cada pessoa, seja neurotípica ou autista, precisa de um espaço próprio para sentir, processar e expressar suas emoções. No caso da minha filha, sua maneira única de entender a morte e demonstrar saudade me mostrou que o luto pode se manifestar de formas inesperadas, e isso é completamente válido.
Essa vivência também me fez refletir sobre a importância de estar ao lado das famílias que enfrentam desafios semelhantes. O apoio, o acolhimento e a paciência são fundamentais para ajudar as crianças a processarem suas emoções. A chave está em respeitar o tempo de cada um, sem pressa ou pressões externas, e em usar recursos adaptados, como histórias, desenhos e objetos simbólicos, para facilitar a comunicação e o entendimento.
Se você está passando por uma situação parecida, lembre-se de que não existe uma forma certa ou errada de viver o luto. Cada pessoa tem seu próprio ritmo, e o importante é oferecer amor, compreensão e apoio contínuo. Seja qual for a maneira que sua criança tenha de expressar suas emoções, valide seus sentimentos e permita que ela explore sua dor e saudade de forma que seja confortável para ela.
Em momentos tão delicados, é essencial que as famílias se sintam acolhidas e não sozinhas. O luto é um processo único, e respeitar as diferentes formas de sentir e expressar esse sentimento é o primeiro passo para ajudar as crianças, e até nós mesmos, a curar. Juntos, podemos oferecer um espaço de compreensão e apoio para que cada um encontre sua própria forma de seguir em frente, levando consigo as memórias dos que amamos.